por Isabel Fomm de Vasconcellos Caetano

Não deixa de ser engraçado ver, nos meios de comunicação, tantas mensagens rosadas exaltando o lado doce e meigo das mulheres por ocasião do 8 de março.
Todo mundo quer vender seu peixe e tirar sua casquinha do Dia Internacional da Mulher, o que não tem nada de errado numa sociedade capitalista como a nossa.
Pouca gente se preocupa, no entanto, em saber porque é que existe esse dia e de onde ele vem.
Até aí, também nada de errado, uma vez que é a mesma coisa com o Dia das Mães ou o Dia dos Pais. Ninguém quer saber a origem, só quer comemorar e faturar.
O Dia das Mães ainda não tem 100 anos e apareceu quando Anna Jarvis, uma americana, perdeu sua mãe e ficou muito mal. Suas amigas resolveram dar uma festa para alegrá-la e ela, então, resolveu que seria uma festa em homenagem à sua mãe e a todas as mães do mundo, vivas ou mortas. A idéia se espalhou e, em 1914, o presidente Woodrow Wilson fixou a data em 9 de maio.
No Brasil, é comemorado, desde 1932, no segundo domingo de maio, por decreto do ditador Getúlio Vargas.
Já o Dia Internacional da Mulher é um pouco mais velho, embora só tenha começado a ser comemorado pra valer em nosso país no começo da década de 1980, com o fim da Ditadura Militar.
No começo, as próprias mulheres debochavam das que se preocupavam com o 8 de março. Era uma data mal vista, era uma data socialista, num tempo em que o Brasil, de modo geral, pensava que os comunistas comiam criancinhas no jantar.
Hoje pouca gente sabe que esse não é um dia de festinhas sentimentais e presentinhos doces, como o Dia das Mães.
Em todo o mundo, para as mulheres de vanguarda, o 8 de março é um dia de reflexão sobre a condição de todas as mulheres sobre a Terra.
Ultrapassa em muito o rótulo de socialista. Trata-se de combater a discriminação e o preconceito contra o sexo feminino, coisas que – mesmo em países de legislação feminina avançada como o Brasil – ainda estão completamente presentes em nosso cotidiano.
A Lei Brasileira, no que tange ao direito das mulheres, costuma ser invejada pelas feministas de outros países em Congressos Internacionais. Mas isto se deve apenas às feministas brasileiras que, mobilizadas e unidas, trabalharam duramente para incluir na Constituição de 1988, todas as velhas reivindicações das brasileiras. Elas conseguiram. Mas ninguém mais se lembra.
A humanidade é assim mesmo. Uns poucos e heróicos lutadores se matam para fazer avançar as conquistas sociais das quais todos vão usufruir. E, depois, os que usufruem torcem o nariz para os que conquistaram.
Mulheres modernas morrem de medo de serem tachadas de feministas porque embarcaram de cabeça nos mitos criados pelos machistas: todas as femininas são feias, mal amadas, frustradas, odeiam homens e outras enormes cretinices que foram – e ainda são – divulgadas sobre as heróicas mulheres que conquistaram para nós, mulheres contemporâneas, todos os direitos que temos hoje.
Votar, ter prazer sexual, estudar, trabalhar, ser dona de seu próprio nariz, poder ter propriedades e bens em seu próprio nome, fazer contracepção, andar sozinha pelas ruas, ficar com a guarda dos filhos na separação, todas essas coisas que nos parecem tão normais, não eram permitidas às mulheres até muito pouco tempo atrás. E, para algumas mulheres, em algumas partes do mundo, ainda não são.
Quem conquistou tudo isso para nós?
As heróicas feministas. Muitas foram presas, muitas morreram, outras foram torturadas e ficaram com a saúde comprometida para o resto de suas vidas.
Não eram feias. Não eram mal amadas. Não odiavam os homens. Eram mulheres de verdade, mulheres de fibra, mulheres de valor, muito mais do que as bobonas ignorantes que zombam delas.
Por isso, o 8 de março não é, como o Dia das Mães, um dia de todas.
O Dia Internacional da Mulher é o dia das corajosas, das verdadeiras, das destemidas, das ousadas.
Ele foi criado na Conferência Internacional Socialista de 1910, por proposta da alemã Clara Zetkin, militante feminista.
Isso porque foi em 8 de março de 1857 que 129 operárias fizeram a primeira greve feminina da história, em Nova Iorque. Elas reivindicavam a redução da jornada de trabalho de 12 para 10 horas por dia. Os patrões e a polícia simplesmente puseram fogo na fábrica onde elas estavam e todas morreram queimadas.
Queimar mulher, fazer churrasquinho de mãe, aliás, sempre foi uma constante na história da humanidade. A Inquisição queimava as supostas bruxas. Fez isso durante seis séculos. Os hindus queimavam as viúvas e os americanos do século XIX queimaram operárias.
Nem todas podem ser Joana D’Arc.
Por isso, o Dia Internacional da Mulher é o dia de poucas mulheres valentes.
Se você é uma delas, parabéns.
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